quinta-feira, setembro 15, 2005

Um texto em homenagem a um texto que nunca existiu

Há tempos que venho tentando escrever um texto sobre solidão. Não a solidão no sentido usual da palavra... Eu queria falar sobre a minha solidão. Essa solidão que me acompanha desde que eu nasci. Uma solidão que não é nem boa nem ruim. Nem qualidade nem defeito. Uma característica minha. Essa que é talvez a parte central do meu ser. O que faz o Leandro Discaciate ser Leandro Discaciate.

Comecei a escrever, apaguei tudo. Recomecei um texto que já não tinha nenhuma semelhança com o inicial. Pensei nisso quando dormia, tomava banho, olhava pela janela do carro. Cheguei a escrever um terceiro esboço, que também foi deletado.

Foi então que finalmente entendi. Eu não ia conseguir fazer esse texto tão importante (sem ilusões, ele importava somente a minha pessoa). Esse texto não existiu porque simplesmente havia, ao mesmo tempo, tanto para se falar e quase nada. Esperava um texto completo. Eu queria traduzir o meu sentimento central em palavras. E com isso fazer que todos compreendam como eu me sinto. Queria que as pessoas me vissem. Queria compartilhar essa solidão.

E ninguém (muito menos eu) jamais conseguiu sintetizar a sua pessoa em umas poucas palavras. Fico feliz por não conseguir escrever sobre a minha solidão. Talvez eu o faça, mas com certeza não será um texto completo. Se eu fizer, serão apenas fragmentos de um texto maior. Texto maior este, que jamais será escrito por completo.

Por enquanto, se contentem com esse texto sobre uma tentativa fracassada de escrever um texto.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Isso sempre me ocorre. Seu texto condensou muito bem o sentimento que queria passar. Eu gostei. e senti. Temos uma tendência pessimista de achar melhor o que os outros escreveram e jogar o tempo inteiro nossas idéias fora. Puro existencialismo.

1:55 AM, setembro 30, 2005  
Blogger La Maya said...

52 hertz calling Leandro, do you copy?

É... eu entendo, e ao mesmo tempo não entendo (cérebro de Schrodinger?). Eu sei bem o que é a minha solidão, essa que me acompanha desde criança, essa que sempre fez parte da minha essência, essa que não é boa e nem ruim. Eu na verdade sempre fiquei muito bem sozinha, na minha própria companhia, desenhando, lendo, escrevendo,ouvindo música, cantando, brincando de índia no quintal de casa sem suspeitar que de fato eu tinha ascendência indígena, quase sempre sozinha na escola até por volta dos meus 13 anos, encontrando pessoas na rua e tendo que ouvir delas: "você sempre sozinha, né?", "pois é", "é.." "então...". Indo ao cinema e a eventos culturais sozinha, viajando sozinha, até saindo pra curtir a noite sozinha, e isso realmente nunca me incomodou. Bem, sempre tem um momento em que isso incomoda, essa coisa de não pertencer, não se adequar, não se encaixar, viver às margens, ter poucos amigos verdadeiros apesar de me dar bem com todo mundo e viver circulando por entre os grupos, as panelinhas e tal. Até nesse sentido eu sempre fui alguém "livre", fora de regras e padrões. Mas tem uma coisa que sempre doeu, isso de raramente me apaixonar, de nunca dar certo, de passar 99% dos dias dos Namorados sozinha e me lamentando. Mesmo para os introvertidos a solidão às vezes machuca. Ou muitas vezes machuca. Eu entendo bem essa minha solidão, essa que faz parte da minha essência. Mas é realmente impossível tentar fazer outros compreenderem o que só a gente sente na própria pele. Como explicar-se? Como se traduzir para a linguagem dos sentidos do outro? Isso me incomodava muito, muito quando criança, com uns seis ou sete anos, quando cheguei a perguntar à minha irmã mais nova: "você não acha estranho a gente sentir só a gente mesma? Eu acho que a gente deveria ser capaz de sentir tudo, de sentir os outros, de sentir tudo só com a ponta do dedo ou com o cotovelo. Não é estranho isso?", ao que minha irmã simplesmente ficou muda de espanto e perplexidade e obviamente vazia de respostas. É. Eu fui uma criança muito esquisita, rs. Aquela criança existencial que levou muito a sério a fase dos "por quês?" e foi até o final da brincadeira, quase convertendo a mãe espírita numa atônita, e afônica, niilista. Um pouco mais crescida, eu tinha pena de "Deus", porque "Ele" compreendia tudo e todos, mas ninguém era capaz de compreendê-lo, e portanto ele deveria ser muito sozinho e triste. Definitivamente eu fui uma criança bem esquisita e existencialista, rs. Mas a gente não se explica, isso ao menos eu acabei por aprender. Tantas vezes mal compreendemos a nós mesmos, agora imagine tentar traduzir para os outros aquilo que somos, a nossa essência? Entendo por que você nunca mais tentou fazer o texto, ou porque ele nunca foi postado aqui.Em relação a mim, se o (infinitamente) 7pouco que eu conseguir passar de mim mesma aos outros for minimamente compreendido, já vou me considerar no lucro. ;)

12:50 AM, setembro 30, 2017  

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