Algo curioso e triste
Já vi muito nessa vida...
Eu estava pensando sobre um acontecimento bastante interessante, e triste.
Os meus fiéis leitores imaginários sabem que recentemente viajei como guia, para Machu Picchu. Na trilha Inca que eu fiz (Tambomachay) eu vi algo que ficou impresso na minha mente. Foi nas proximidades de um daqueles minúsculos vilarejos locais.
Havia uma Lhama (animal muito popular na região do Peru) que quebrou uma das patas ao saltar. Como é de costume ela seria sacrificada, para poupar-lhe do sofrimento e poupar os donos do trabalho.
Esse sacrifício foi rápido. Em um segundo temos vida e em outro nada... A Lhama nem sequer emitiu um som. Apenas ficou com os olhos firmes no céu, enquanto a sua garganta era cortada. Coisas da vida.
No alto da colina, não muito distante, estava a cria dessa Lhama. A jovem Lhama assistiu a toda a cena queita, sem mover um músculo. Seus olhos se mantiveram fixos na mãe o tempo todo. E esses olhos negros carregavam toda a dor da existência.
Não sei qual a razão de eu lembrar disso agora... Sei que vai soar meio bizarro e mórbido, mas essa cena não foi somente profundamente triste. Foi também bela. Com uma daquelas belezas tristes, tão poéticas.
Dizem que só os seres humanos são capazes de projetar a morte. De ver um semelhante morrer e entender que inevitavelmente isso também vai acontecer com ele. Mas naquele instante eu poderia jurar que a jovem Lhama havia finalmente entendido o seu destino nessa terra:
“Cumpriu sua sentença, encontrou-se com o único mal irremediável, aquilo que é a marca do nosso estranho destino sobre a terra, que de fato, sem explicação, iguala tudo que é vivo em um só rebanho de condenados, porque tudo que é vivo morre”.
2 Comments:
Ai, q triste isso. Eu jamais poderia assistir uma cena dessas. Na boa, não tenho estrutura. Não suporto ver o sacrifício de animais, ainda mais p/ "poupar os donos do trabalho". Não entra na minha cabeça. Nossa, com a cria assistindo a cena então.. eu ia me acabar de chorar. É mta crueldade, mesmo q faça parte da cultura, ou seja lá qual explicação arrumem pra isso.
Senti toda a dor da lhama ferida... senti toda a dor do filhote... E sei bem o que você quer dizer com "belezas tristes, tão poéticas"... Enquanto eu lia o final do seu texto eu só conseguia lembrar de uma cena que reflete tão bem toda essa mistura de dor e de poesia que vai dentro de cada ser sobre esta terra: a cena da tourada em "Fale com Ela", de Almodóvar. Eu sou extremamente passional quando se trata de animais e da questão das touradas na Espanha. Não sei, é alguma coisa no meu sangue, memórias tão marcantes de uma vida passada, quem pode saber... Desde criança eu sempre nutri um ódio mortal pelas touradas, amo demais os animais. Nem barata e aranha eu mato, sou daquelas que ficam espantando pra outro canto pra não ter que matar. Mas quando vi essa cena, ah, a genialidade, a sensibilidade de Almodóvar... nunca, nunca a dor e a morte me pareceram tão bonitas, tão poéticas. Uma das cenas mais lindas e marcantes do Cinema, na minha opinião. E a suavidade quase etérea, e ainda assim tão intensa, da voz de Elis... Toda a dor e toda a poesia numa cena só. É meio que a poesia de Wes Anderson em Steve Zissou encontrando a dor e a brutalidade de Iñárritu em Amores Perros. "We are also what we have lost", and we are also what is yet to be lost...
https://youtu.be/WsV9g9aPYuY
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